segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Vigíla pela Liberdade de Expressão: uma perspectiva

A vigília correu muito bem. Houve intervenções de Justino Pinto de Andrade, Filomeno Vieira Lopes (presidente da Frente para a Democracia), Alexandre Sebastião André (presidente do Partido de Aliança da Juventude Operária e Camponesa de Angola), Jorge Macedo (Associação Justiça, Paz e Democracia), Padre Pio e soba Catapi. Intervenções muito duras no conteúdo, mas inteligentes na forma. Denunciaram as intimidações que são constantemente feitas aos jornalistas e à sociedade em geral, a complacência e cobardia da oposição, os desmandos do governantes. Recordaram jornalistas "assassinados pelo regime", chamaram os bois pelos nomes. Nos intervalos houve poesia de intervenção e música do Brigadeiro 10 Pacotes e MCK .

Pela minha estimativa, estavam cerca de 200 pessoas. Todas reunidas de forma muito ordeira, pacífica e empenhada. Pessoal de realce: o director do gabinete de direitos humanos da ONU, Vegard Bye (enquanto observador), David Mendes (presidente da Associação Mãos Livres, promotora da iniciativa), o advogado Luís Nascimento, sobreviventes do 27 de Maio, jornalistas, músicos, poetas, actores, pessoal de ONG's nacionais e (muito poucas) internacionais.

A Polícia Nacional também lá estava. Era um cordão imenso em torno da rotunda do 1º de Maio. Mantiveram-se afastados, como meros observadores. O Justino Pinto de Andrade, logo no início, agradeceu-lhes o facto de, pela primeira vez, estarem num acto do tipo enquanto defensores do direitos dos cidadãos, e não de agressores.

O único momento tenso foi quando alguém reparou que no topo do prédio ao lado do largo 1º de Maio estava uma câmara ligada a filmar tudo. Quando o camera man reparou que tinha sido topado, foi logo embora. Não estando ali nenhuma televisão, quem seria?

Comunicação social presente: DW, Lusa, semanários privados, Rádio Ecclésia, Rádio Despertar (Unita). Não vi mais ninguém. Um episódio curioso. Numa das intervenções (creio que do Sebastião André), as pessoas começaram a gritar "Queremos a TPA!". Uma alusão à manipulação completa dos órgãos públicos de comunicação. Também se cantou o refrão da música "Eles comem tudo e não deixam nada". Zeca Afonso para descomprimir. Momentos de humor também com as constantes comitivas de recém-casados que iam até ali para tirar uma fotografia com Agostinho Neto e que, com os seus fatos cheios de laçaratores, acabavam por se misturar com os manifestantes.

No final era evidente o alívio por as coisas terem corrido bem. Durante a tarde, antes da vigília, a Polícia havia dado o dito por não dito, afirmando que a manifestação não se poderia realizar no largo por causa da figura do Agostinho Neto. Ou não fosse aquele espaço o típico reduto das comemorações do MPLA. Mas mesmo assim as pessoas foram e correu tudo bem.

Aquele foi um ponto de viragem. Pelo que se teve a coragem de dizer em público, pela adesão e pela tranquilidade que reinou do princípio ao fim. Independentemente das repercussões que a manifestação poderá ter para quem esteve ali presente, a verdade é que a liberdade ganhou pontos. E os milhares de pessoas que passaram de carro pelo largo durante as duas horas da vigília, levaram, de certeza, uma coisa para casa - a ideia (surpreendente para muitos) de que em Angola é possível manifestarmo-nos por aquilo em que acreditamos. E que é urgente acabar com o medo!

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