domingo, 16 de setembro de 2007

Carta de ONGs à Presidência do Conselho da União Europeia

31 de Julho de 2007
Para: Dr. Luís Filipe Marques Amado,
Presidência do Conselho da União Europeia

Exmo. Dr. Amado, A Amnistia International (AI), o Centro para Direito à Habitação e Despejos Forçados (COHRE), a Christian Aid, a Front Line, a Global Witness, a Organização Intereclesial para a Cooperação para o Desenvolvimento (ICCO), o Instituto Holandês para a África Austral (NiZA) e a Oxfam Novib dirigem-lhe esta carta na sua capacidade de presidente em exercício do Conselho de Ministros da União Europeia (UE) para manifestar preocupação relativamente a recentes acusações efectuadas por dirigentes angolanos contra defensores de direitos humanos em Angola. Nós apelamos a uma resposta firme da União Europeia a estas acusações, em conformidade com as Orientações da União Europeia Relativas aos Defensores dos Direitos Humanos, adoptadas pelo Conselho em Junho de 2004.

Como talvez seja do seu conhecimento, em 10 de Julho o Director da Unidade Técnica de
Coordenação da Ajuda Humanitária do Governo Angolano, Sr. Pedro Walipi Kalenga, alegou numa transmissão de rádio que certas organizações nacionais e internacionais1 que operam em Angola estavam a violar a lei e a mobilizar a população para se opor a medidas do Governo. Ele acusou as organizações de serem apoiadas por partidos políticos da oposição e de usarem questões de direitos humanos como cobertura para violarem a lei e desobedecerem ao Governo. Ele ameaçou que alguns casos serão investigados pelo Procurador-Geral e que organizações estrangeiras poderiam ser
subsequentemente expulsas.2

Consideramos encorajador o facto de, em reunião de 19 de Julho, os Chefes de Missão em Luanda terem discutido esta questão. Infelizmente, a EU decidiu não tomar qualquer atitude sobre este assunto. Esta decisão foi alegadamente tomada com base no facto de, numa reunião com as NU e representantes de doadores, um representante do Ministério da Justiça angolano ter afirmado que o Ministério não tem qualquer problema com o estatuto legal destas organizações. No entanto, as acusações foram mantidas pois nenhum responsável governamental veio a público corrigi-las. Até ao
momento, nenhuma das organizações foi formalmente notificada de nenhuma transgressão ou informada acerca da base jurídica para estas acusações. O reconhecimento pelo Ministério da Justiça da legalidade das actividades destas organizações não constitui, a nosso ver, razão para a EU não agir. Pelo contrário, ele é prova evidente da má vontade dos representantes governamentais que alegam que estas organizações estão a violar a lei, e do fim intimidatório das suas declarações.
Nós encaramos as acusações do Sr. Walipi, transmitidas nos órgãos de comunicação social controlados pelo Governo, como parte de um esforço continuado e sistemático por parte do Governo angolano, para vilipendiar defensores de direitos humanos nacionais, cujo trabalho é não só legítimo como fundamental numa sociedade democrática. Acusações semelhantes contra as associações Mãos Livres e SOS Habitat foram efectuadas anteriormente em diversas ocasiões. Também já este ano o Sr.
Walipi declarou publicamente que a UTCAH estava a analisar as actividades de várias organizações registadas e iniciaria, eventualmente, processos conducentes ao seu encerramento.
Segundo fomos informados, o Escritório das Nações Unidas em Luanda também está muito preocupado com as declarações e atestou a legalidade e legitimidade das actividades destas organizações. Os líderes das organizações com quem falámos directamente, Open Society - Angola, Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD), SOS Habitat e Associação Mãos Livres, também avaliam esta situação como muito séria. Eles acreditam que o objectivo de tais declarações por parte de autoridades
governamentais é pôr em causa a sua legitimidade junto do público e dos doadores, possivelmente com o fim de prejudicar actividades relacionadas com as eleições. Eles receiam que, sem pressão internacional, possam vir a enfrentar acções jurídicas para encerrar as suas actividades, tal como aconteceu no caso recente da associação angolana Mpalabanda (a única organização de direitos humanos a trabalhar na província produtora de petróleo de Cabinda).
A Open Society - Angola, a AJPD, a SOS Habitat, e a Associação Mãos Livres são organizações que trabalham, todas elas, para promover e proteger os direitos humanos, como definido e discutido nas Linhas de Orientação da União Europeia sobre Defensores de Direitos Humanos, incluindo “documentando violações” e “procurando vias de recurso para as vítimas de tais violações através da provisão de apoio jurídico, psicológico, médico ou outro.”
Como tal, partilhamos a opinião destes defensores de direitos humanos de que acção por parte da EU é necessária e urgente. A EU deveria manifestar preocupação com violações contra defensores de direitos humanos e salientar a legitimidade do trabalho destes defensores de direitos humanos, por referência aos padrões internacionais e aos compromissos em matéria de direitos humanos assumidos
pelo país terceiro. Apelamos à EU para expressar junto das autoridades angolanas ao mais alto nível possível a sua preocupação relativamente á difamação e perseguição - ou assédio ? -, por parte de autoridades governamentais, de organizações que desenvolvem actividades legítimas de direitos humanos. A UE deveria - ou deverá? Ou deve? - exigir o fim desta intimidação e solicitar que o Governo clarifique publicamente a sua posição relativamente à legalidade e legitimidade das suas
actividades, anulando assim as acusações do Sr. Walipi e outros. Apelamos também a que a EU se mantenha em contacto com estes e outros defensores de direitos humanos em Angola, de modo a avaliar quaisquer obstáculos actuais ou potenciais às suas actividades. Acreditamos que uma tal resposta, tal como previsto nas Linhas de Orientação da EU sobre Defensores de Direitos Humanos, é requerida pela seriedade desta situação.
Agradecemos a atenção dispensada a este assunto e esperamos receber informação sobre quaisquer acções relevantes levadas a cabo pela sua presidência, tão breve quanto possível.

Com os melhores cumprimentos,

Erwin Van Der Borght
Director, Programa de África
Amnistia Internacional

Jean du PLessis
Director Adjunto
Centro para Direito à Habitação e Despejos Forçados

Paul Valentin
Director Internacional
Christian Aid

Mary Lawlor
Directora
Front Line

Simon Taylor
Director
Global Witness

Hans Bruning
Director do Programa Internacional
Oganização Interclesial para a Cooperação para o Desenvolvimento

Margot Andriessen
Directora Geral a.i.
Instituto Holandês para a África Austral

Sylvia Borren
Directora Executiva
Oxfam NOvib

cc.
Director, Unidade de Direitos Humanos, Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Lisboa
Director de Serviços para a África Subsaariana, Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal,
Lisboa
Embaixadas da União Europeia, Luanda
Comissão Europeia, Bruxelas
Delegação da Comissão Europeia, Luanda
Parlamento Europeu – Comité do Desenvolvimento
Parlamento Europeu – Sub-comité dos Direitos Humanos

Sem comentários: